Para o compreendermos temos que tentar descrever a sua poética, os conceitos que estão por detrás da sua produção artística: erradamente tomado, por alguns, por um pós-modernista, enquanto arquitecto, A. é um funcionalista que exacerba a função estética; para ele a função da Arte é produzir emoções artísticas e essas emoções estão no cerne da espiritualidade humana. A Arte, para cumprir a sua função, segundo ele, tem que ser rigorosamente inútil, efémera e anônima. Daí o seu fascínio pelas instalações temporárias e pela ousadia da cidade do Porto se ter transformado numa gigantesca instalação temporária para receber os visitantes, proporcionando-lhes a emoção artística de a ter que percorrer a pé ou de biciclete, enquanto exércitos de ucranianos a destruíam e reconstruíam, numa azáfama que se aproximava da sua ideia radical da inutilidade da Arte -- para tudo que não seja a criação efémera dessa emoção.
Como ele é escultor, trouxe-o a Santo Tirso, para visitar o museu de escultura ao ar livre, de que ele já tinha ouvido falar. Não me surpreendeu que a sua obra preferida tenha sido a de Cabrita Reis, o escultor que viria a representar Portugal na Bienal de Veneza e que, quando fez esta obra em Santo Tirso, ainda estava muito longe da fama internacional. Imagino que tenha perdido as boas graças de A., entretanto, porque a sua poética funcionalista foi buscar ao design a valorização intransigente do anonimato.
O que só soube agora, foi que A. viria a conseguir da Camara de Santo Tirso uma encomenda para uma escultura, melhor, uma instalação temporária prolongada, num dos cruzamentos com mais trafego da cidade, perto do Tribunal e do Hospital e com um contrato de que ela seria rigorosamente inútil e anônima durante, pelo menos, seis meses, tendo que ser retirada ao fim desse tempo sob pena de uma pesada indemnização ao artista.
A ousadia artística da Camara merece um rasgado louvor, que aqui fica lavrado, na pedra virtual deste blog inútil!
"Ceci", a maior instalação de realismo subjectivo até hoje construída, utiliza um ready made, neste caso uma grua abandonada, uma homenagem ao design, usado por esta poética com a função exclusiva de criar "o delicioso incómodo da emoção artística", nas palavras do autor.
Eis a galeria pela qual o visitante pode penetrar na instalação temporária, ainda patente na Avenida Sousa Cruz por mais alguns dias.
Resta referir que A. se considera discípulo de Bernardo Soares, o qual visitou na Clínica de Cascais em 1988, de onde o escritor ainda assistiu, anónimo, à publicação e ao sucesso mundial do seu livro.
Parabéns, mais uma vez, à Câmara de Santo Tirso!
