Lembro-me de me dizerem que não tinha "os pés no chão". Quando uma informação é muito incómoda, quando ela vem pôr em causa as convicções que temos e nas quais baseamos o nosso entendimento do mundo há uma natural tendência para a negação. Em vez de tentar prevenir a catástrofe tratamos de ridicularizar quem a anuncia. O "desenvolvimento" era identificado com a industrialização e os "ecologistas" tinham que ser identificados com velhos do Restelo que queriam voltar para a Idade Média. Os dados existiam mas não a vontade de os conhecer.
Hoje, no jornal " O Público", vem um gráfico com uma previsão do crescimento demográfico nos países europeus para os próximos 50 anos, divulgado pela Eurostat. Portugal, daqui a 50 anos, terá mais 600 mil almas que agora, crescerá apenas 6% ! Daqui a 50 anos os oficiais 12.800 habitantes da freguesia de Santo Tirso estarão acrescentados de 768 novos!
Desgraçadamente, a indústria principal deste paraíso ecológico é a da construção civil, é ela que movimenta mais capital e emprega mais pessoas. Poderíamos pensar que ainda tem 600 mil habitantes para quem construir, nos próximos 50 anos, há de se aguentar! Mas é preciso sabermos que, nos últimos 50 anos, ela construíu 4 ou 5 vezes mais que isso! Foi assim que se tornou a indústria dominante no país, aquela que põe governos e tira governos (normalmente não precisa de tirar as Câmaras), assim como nos Estados Unidos da América é a indústria de armamento quem escolhe os presidentes que mais armas comprem, que mais guerras façam!
Por falar em E.U. da América, a guerra contra o Obama é feita pelos que negam a informação; negam o pico do petróleo, por exemplo, querem ir buscá-lo ao Alasca, área protegida, esquecendo que vão buscar 1 ou 2% do que se consome e que a procura será sempre maior que a oferta.
Outro número, cuidadosamente esquecido, é o de habitações em Portugal.
Quando, há pouco tempo, os compradores de casas se esgotaram, na Califórnia, e estas caíram para menos de metade do preço que valiam antes, como havia créditos baseados no seu valor acrescentado, não diminuído, esse "subprime" criou uma crise mundial no sistema financeiro; em Espanha e em França o assunto é levado a sério, porque faz doer. Entre nós os empreiteiros não se assustam, limitam-se a negar os dados. Não devem pensar nas pessoas, que quase todas compraram uma casa, e que, quanto mais eles construírem, mais pobres ficarão e terão que continuar a pagar ao banco o que já não vale o que valia quando compraram.
Deve ser o caso da Herilgar, empresa que desconheço e a quem o plano de pormenor das Rãs atribui quase metade dos 113 mil m2 de habitação previstos. O crescimento da população (os tais 6% em 50 anos) caberá, à vontade, nas casas antigas que vão ficando à venda mas a política que se vende é a do betão, nem que seja para cima da área verde protegida ou da melhor fábrica textil da região, a "Fábrica do Arco", que sofrerá uma pressão urbana para emigrar e levar para o monte os seus operários; se não for para a Polónia.
Mas eu " não tenho os pés na terra". Os que têm ainda vão ganhar dinheiro. Dinheiro público que está em mãos cheias de senso comum, vazias de bom senso.
N.B.(26/9/08) Corrigi "40 ou 50 vezes isso" para "4 ou 5 vezes isso"; ter-se-hão construído à volta de 3 milhões de habitações nos últimos anos. De um grande déficit passou-se para um grande excedente.
Também me intriga que se construa num concelho cuja população não tem aumentado. Mas o risco é de quem constrói e se as casas ficarem mais baratas, melhor para os jovens.
ResponderEliminarSe forem casas baratas ainda podem ser úteis. Mas os pato-bravos agora só sabem fazer condomíneos de luxo... Vê-se no plano uma falta de respeito pela reserva agrícola, pela lavoura em geral, uma das actividades importantes do concelho. Para onde vai a Cooperativa agrícola, destruída no plano? Fernando Pessoa definia provinciano como o que se entusiasma com as grandes cidades.
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