domingo, 15 de fevereiro de 2009

Economia

Em tempos de escassez, como este e o que aí vem, a economia, a gestão dos recursos, é ainda mais importante que antes. Seja numa família, seja num município, seja num país, a primeira coisa a fazer, com o pouco ou muito dinheiro de que se disponha, é arrumar as necessidades por importância decrescente. Primeiro é preciso comer e só no fim "é preciso" comprar um Porche. Se a hierarquia das necessidades for racional, se tiver sido bem matutada, vive-se necessáriamente melhor.
Se os médicos andarem a percorrer o serviço de Urgência à procura de um aparelho de medir as tensões, perdendo tempo e ganhando stress, o qual prejudica o seu desempenho, certamente que comprar alguns aparelhos desses está à frente, na lista de prioridades, da construção de novas instalações, as quais serão óptimas e necessárias, depois! 
E, da mesma maneira, se se reduz, para poupar dinheiro, o nível de prestação de serviços da nossa Urgência e se manda tanta gente gastar gasolina a caminho de Famalicão por razões económicas, que sentido faz ir gastá-lo em obras vaidosas? 
Faça-se o mais necessário antes do que o é menos. Economia é a definição de prioridades. É claro que é mais importante o funcionamento de um serviço que a arquitectura que o serve. E, diga-se de passagem, a arquitectura que não tiver uma poética funcionalista autêntica não consegue ter beleza autêntica (vão tristes os tempos, por esse lado também!); o que não quer dizer que se esqueça a função puramente estética, a decoração até -- é só respeitar a tal coisa da hierarquia das prioridades, a economia!
Por exemplo a ideia (que se mantém!) de gastar 7,3 mil milhões de euros a fazer uma linha de comboio nova, de alta velocidade, que pouparia cerca de 20 minutos na viagem Porto/ Lisboa (a quem pagasse o bilhete caríssimo: poucos, logo risco de falência e mais despesa!). Dinheiro mal gasto que daria para tanta coisa... (e gasto a destruir centenas de hectares de árvores e campos, casas, quiçá, para fazer uma linha inútil); deixo aqui, com a devida vénia, um artigo esclarecedor e lembro que se vai de Copenhaga a Estocolmo de Alfa pendular (mais sóbrio que o nosso!) e que ninguém se lembra, nesses países ricos, de construir um TGV (se calhar são ricos porque sabem gerir os recursos, fazem da saúde pública uma prioridade, por exemplo):
Os empregos que o "Call Center" cria são necessários, há que o alojar. Também é necessário recuperar edifícios que são património arquitectónico em zonas bem centrais. E é necessário preservar as áreas verdes, não as construir. Como a função (uns cubículos com um aparelho) é simples de meter num edifício antigo, para que se constrói um novo, ainda por cima sacrificando uma área verde? 
A resposta, infelizmente, deve ser a mesma que explica o TGV: o poder político tem a quem prestar contas -- e não é à opinião pública, que está um pouco mais desperta, é certo!, é à indústria dominante no país.

Aqui se lamenta, a propósito, o desaparecimento do blog "opinão do Vítor", o qual, creio, continuará a escrever no "Entre Margens".

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Uma doença perigosa

Todos nos cruzamos quotidianamente com doentes mentais sem os diagnosticar, todos somos, em parte, doentes, a saúde perfeita é um conceito abstracto, não existe. O que interessa é procurar caminhar no sentido da saúde, definida pela O.M.S. como sendo “o estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não somente a ausência de enfermidade ou invalidez”, e evitar caminhar no sentido da doença.
No caso da saúde mental, é fácil perdermos o pé da realidade e cairmos num delírio, sobretudo se a realidade for dura e todos à nossa volta nele viverem; e se esse delírio for sistematizado e for partilhado por muitos, então todos vivem "felizes" até ao dia em que a realidade se imponha. Por isso épocas como esta são necessárias, abençoadas, são épocas em que podemos “cair na real” (ou num novo delírio, claro!). Um exemplo extremo foi a Alemanha hitleriana, nascida de uma pobreza também ela extrema: se um cidadão não alinhasse no delírio sistematizado de que a raça “ariana” tinha obrigação de dominar as outras todas, então os delirantes iam-lhe tirando bens, emprego, casa e podia chegar a um campo de extremíneo; alinhar com o delírio era instinto de sobrevivência. Mas o delírio de milhões não deixa de ser delírio por serem milhões os delirantes.
Um exemplo quotidiano, banal, é a burocracia. É muito fácil a um funcionário, naturalmente preocupado com o seu lugar na carreira, tomar os papéis que preenche por trabalho útil, até indispensável à função que exerce. No seu delírio, imagina mesmo que os papéis espelham a realidade e consegue contagiar outros para a sua convicção. Lembro-me de um médico a comer laranjas em frente a um hospital do interior – há que anos! – dizendo que já tinha trabalhado muito, tinha comido cinco laranjas! Estava a brincar com um colega burocrata que costumava dizer “já dei cinco altas hoje”; esse deixava os doentes com a terapêutica com que entravam pela Urgência e depois preenchia e assinava a alta: imaginava ter trabalhado muito.
Ou imagino o processo completo, volumoso, do licenciamento daquele prédio ora destruído, “sito” numa linha de água: a imponência do volume e das assinaturas decerto ofuscava a evidência de que não deveria ser construído – e contagiou os pobres cidadãos que acreditaram nele e nele investiram capital e esforço.
Este é um tempo em que, quem quiser, pode ver a realidade. Aproveitemos! Os professores do secundário descobriram que não andavam a ensinar mas a alimentar o delírio da sua burocracia. A esta nada interessa o que aprendam, de facto, os alunos, que é a função da escola; interessam os papéis que se referem a isso, o que é bem diferente! Há, por exemplo, um curso para professores destinado a ensinar-lhes como se pode avaliar positivamente um exame em que o aluno mostrar total ignorância!
O paradoxo de tomar os números, as estatísticas, pela realidade é impressionante. A subversão da matemática, ciência exacta, posta ao serviço dos delírios, a “força” dos números usada para alienar, assusta. Como assustam as listas dos dinheiros gastos pelos poderes públicos, que os apresentam, vaidosos, sinceramente convencidos de que eles medem a enorme utilidade pública dos seus serviços. Que lhes interessa se interessava fazer aquilo, se havia outras prioridades, se era possível fazer mais barato? O que interessa aos poderosos delirantes é que se gastou muito, os números provam-no!
Mas este, repito, é um ano propício a pôr os pés no chão, a recuperar a saúde mental.
Evitemos cair no delírio de culpar a democracia, de propor a censura e o medo: eram e são democracias as sociedades mais prósperas e interessantes da História.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Tempos de mudança (2)

É um tempo de destruição das velhas estruturas; vemos, desde há um ano, como aquilo que não presta vem sendo exposto para ser destruído. Compete-nos limpar o terreno de detritos enquanto desenhamos o projecto das novas estruturas; e compete-nos salvar da enxurrada aquilo que merece ser salvo.
Isto continuará a passar-se, a todos os níveis, durante mais de uma década, tal a magnitude da transformação que começou. Desde os cidadãos até à Ordem Internacional, passando pelas cidades, como Santo Tirso, este é um tempo de mudança.

Como cidadãos teremos que aprender a ser livres e responsáveis. Temos confiado, como crianças, nos nossos governantes, eles que resolvam os problemas, não temos ligado ao nosso papel de cidadãos livres e responsáveis e a necessidade de mudarmos cada dia se torna mais visível. Sem cidadãos conscientes a tendência natural dos governantes é a de se tomarem por insubstituíveis e abusarem do poder que pusemos nas mãos deles. Torna-se cada vez mais clara a necessidade de contribuirmos para o funcionamento das organizações não governamentais; há-as de toda a ordem, desde o nível local ao internacional e novas aparecerão, quando a nossa lucidez permitir que a sua razão de ser seja visível e as criemos. Aproveito aqui para saudar a Liga dos amigos do Hospital de Santo Tirso contando o que vi: dantes havia um barbeiro no Hospital da Misericórdia mas não está previsto na organização actual, não existe esse funcionário público; então vi um simpático cidadão, membro da Liga, não remunerado, que aprendeu a arte e, desde há 3 anos, barbeia doentes, a toalha pendurada no braço, o ar “profissional”; não esperou pela burocracia, barbeia!
Este espírito de ser uns pelos outros, de ser responsável, foi referido por Obama no seu discurso “inaugural”; existem muitas organizações não governamentais nos EUA e ele fez parte de algumas delas antes de ser presidente.

Como país teremos que deixar a infantilidade de pedinchar fundos europeus, que ser responsáveis por uma Europa livre, solidária no mundo. Teremos que ter a coragem de denunciar a corrupção –que tão bem conhecemos! – nos países africanos de língua portuguesa, por exemplo…

…mas, para já, este é o tempo de destruir o disparate, salvando a democracia!