quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Deficit de árvores, abundância de entulho.

O Espaço Público da Urbanização da Quinta das Rãs (Telheiras)
Este terreno, onde hoje se despeja entulho, já fez parte de uma quinta bem tratada. Mas, há trinta e tal anos, a Câmara de Santo Tirso (então PPD/PSD) decidiu que ela teria que ser urbanizada, sob pena de expropriação. O plano de urbanização que foi feito e aprovado, ganhando a força de lei de um plano de pormenor, previa, para a área da fotografia, um jardim público e deixava a plantação e o seu cuidado à responsabilidade da Câmara.
A cidade deve ter uma proporção generosa de áreas verdes em relação às áreas construídas e compete à Câmara controlar a construção desenfreada e cuidar dos espaços públicos arborizados, uso-fruto legítimo dos citadinos.
Mas há um deficit, em Portugal. O deficit a que me refiro não é o de dinheiro no Estado português mas o de democracia na cultura portuguesa.
Na ordem de valores dos nossos eleitos, tanto os do governo central como os das administrações locais, os cidadãos não estão em primeiro lugar. Vêm muito depois da preocupação com aumentar a receita, a maior parte da qual se destina a sustentar a legião de burocratas, geralmente nomeados, cujo trabalho principal consiste em velar por essa receita. E vêm muitíssimo depois dos interesses dos construtores civis amigos, cuja principal tarefa consiste em alimentar o marketing eleitoral, as inaugurações e as fotografias que ele exige.
Só enquanto eleitor o cidadão lhes interessa: sem o seu voto, as nomeações, os ordenados, os privilégios passam para o outro partido, cujas prioridades são as mesmas.
Em democracia haveria uma comissão de moradores que teria participado no projecto do parque/jardim das Rãs, o qual há muito teria sido criado. Na nossa situação de deficit democrático, de democracia formal mas irreal, os cidadãos não fazem parte do processo de decisão que escolhe as prioridades para o uso das receitas disponíveis, dos bens públicos. Estes são tratados como se bens privados fossem, para benefício "privado". Foi o caso deste espaço público, tratado pela Câmara como um terreno para especulação imobiliária, para venda com lucro infinito, só se preocupando com a legalização dessa atitude. E apenas diferindo, nisso, de um especulador particular, em que são os cidadãos quem paga os advogados da Câmara e em que o particular não teria acesso fácil à criação de um plano de pormenor que, sobrepondo-se à lei anterior, abrisse caminho às suas pretensões especulativas, como foi o caso.
Há um deficit "colossal" de democracia real, tanto em Santo Tirso como na maior parte das autarquias e no País.
Plantar umas árvores não teria sido caro nem difícil. Teria sido (e terá que vir a ser!) um lucro para os cidadãos, o bem estar dos quais é o objectivo da administração autárquica, a qual, em nome deles, tem perseguido um "lucro" que os prejudica.

Mas são tempos de mudança, de cidadãos cada dia mais conscientes, mais exigentes, menos sujeitos aos investimentos em propaganda, feitos com os seus impostos! Tempo de criar a Democracia Real!

Post scriptum: Será real esta história que circula na rede?

11 comentários:

  1. burro que não gosta de palha7 de janeiro de 2012 às 03:41

    Palha, meu amigo! Não disse nada de novo!
    Pensa que os moradores sabem que se trata de um espaço publico e que o plano de pormenor que o transforma em área de construção de um edifício de interesse concelhio tem valor nulo por não ter sido aprovado pelos moradores? "Cidadãos conscientes"! "Democracia Real"?
    Acorde em Portugal: manda quem pode, obedece quem deve"!

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  2. Quem pode, numa democracia, é o povo. Quem deve, no sentido de que deve obedecer ao povo, são os políticos dos partidos que se revezam no poder. Os quais também devem no sentido de serem responsáveis pela dívida do Estado, das autarquias e das Empresas públicas. É mais que tempo de obedecerem ao bom-senso.

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  3. Se são os moradores os principais interessados no destino a dar ao terreno, teriam de ser consultados, até porque o valor das suas propriedades depende daquilo que se fizer ao espaço.

    Já que a câmara não tomou a iniciativa de os consultar, porque não ser o presidente da junta de freguesia a fazê-lo?

    Poderia, por exemplo, convidar os moradores para um debate sobre o assunto.

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  4. burro que não gosta de palha8 de janeiro de 2012 às 03:00

    Mais um ingénuo a dar-me palha! Os Presidentes das Juntas de Freguesia trabalham para o seu partido, não para as pessoas da sua freguesia. E, mesmo que ele seja do outro partido e veja aí a perspectiva de alguns votos, o negócio futuro é o mais importante -- não o vai pôr em risco, vai arranjar os votos prometendo construção!

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  5. Obrigado pelos comentários. Aproveito para lembrar os factos: quando, há bastantes anos, a Câmara quis vender este espaço público para construção intensiva, o tribunal (em 2ª instância) impediu-a, por não se tratar do destino que a lei previa para o terreno. Anos mais tarde foi feito um plano de pormenor para a zona a leste desta urbanização e esse novo plano apropriou-se deste terreno, integrando-o como área de construção. Ora a lei prevê que essas alterações só podem ser feitas com o consentimento dos moradores, os quais o não deram pois nem sequer foram consultados. Sendo assim esse plano de pormenor tem valor legal nulo e os moradores podem, a qualquer momento, pedir uma providência cautelar que impeça a construção até ao esclarecimento da legalidade.

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  6. Nesse caso, o terreno foi vendido (?) a um particular que corre o risco de não poder construir lá, caso haja algum morador a pedir uma providência cautelar... É assim?
    Obrigado pelo esclarecimento...

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  7. Obrigado por comentar. É assim que a Câmara vê as coisas, considera-se "dona" do terreno. Mas não lhe foi vendido porque ela nada pagou. A lei ofereceu-lho, com a obrigação de o cuidar como cuida de outros espaços públicos: o Parque D. Maria II, por exemplo. Quando um loteamento é suficientemente grande a lei prevê que tenha um espaço público, o qual é desenhado no projecto. O dono da quinta vendeu os lotes de construção mas aquele terreno foi-lhe expropriado. E muito bem, a cidade não pode ser só prédios!
    Hoje, no jornal "i", vem um artigo sobre um trabalho de 2010, feito pelo actual ministro do emprego antes de o ser, que mostra como, desde 1980, o Estado nomeia pessoas "amigas", mil e tal altos funcionários por ano, para as empresas públicas e para as empresas em que tem mais de 50% , para tudo onde tenha esse poder.
    Portugal pertence-nos, aos cidadãos. O Estado comporta-se como o feitor de uma quinta que tem um proprietário distraído: somos nós, os responsáveis pelo deficit de democracia, pela falta de transparência! Espero tê-lo esclarecido?

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  8. Diz-se, por aí, que nesse terreno vai ser construido o hospital privado...
    Seria uma construção ilegal?

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  9. Sim. O plano de pormenor ao lado desta urbanização apropriou-se deste terreno, o qual tinha sido assunto de decisão judicial ilegalizando a construção de uma Universidade Privada, e deu-lhe um destino novo, de construção de interesse público. Esta "deslocalização" do terreno teria que ter sido aprovada pelos moradores da Urbanização da Quinta das Rãs; como não foi, tem valor legal nulo, embora seja, enquanto os moradores a não denunciarem, a lei sobre o terreno.
    Note a falta de transparência da Câmara, quando escreve "Diz-se, por aí": a Cãmara anunciou, há anos, a intenção de vender o terreno a uma empresa de saúde mas não nos informou sobre a real disponibilidade dos privados para isso. Não deve ser muita, na actual crise! Os recursos só dão para ir continuando a despejar entulho!

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  10. http://www.metronews.com.pt/2008/09/11/camara-municipal-e-%E2%80%9Chospital-privado-de-santo-tirso-sa%E2%80%9D-assinaram-protocolo/

    a Câmara Municipal de Santo Tirso vende à sociedade anónima “Hospital Privado de Santo Tirso, SA” – constituída por sete sócios, quase todos técnicos de saúde do concelho – um terreno sito na Rua Nova da Telheira, em Santo Tirso, pelo montante de 800 mil euros.

    Se tudo correr como se espera, o novo Hospital Privado de Santo Tirso estará pronto a funcionar em 2010, terá uma área de implantação de 1 868 m2, um parque de estacionamento com cerca de 250 lugares e implicará um investimento de aproximadamente 20 milhões de euros. Serão criados mais de 200 postos de trabalho directos.

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  11. Obrigado pelo "link" para o artigo em que todos os privados falam do interesse público. O protocolo assinado com a empresa de saúde para a venda do terreno, imagino que tenha sido cancelado, oxalá sem que a Câmara tenha tido que pagar uma indemnização! Mas a transparência da Câmara só dá para ver as notícias luminosas, não sei o que se passou.
    Sei que, quando a Câmara quiz vender o mesmo terreno para uma Universidade Privada, houve um juiz que a impediu, porque se trata de um espaço público para benefício dos moradores. Anos mais tarde, discretamente, o terreno foi "deslocalizado" para a alçada do plano de pormenor ao lado, sem o necessário consentimento dos moradores e com a intenção de ser possível vendê-lo.
    A ideia do "post" é a de que se não pode confundir o lucro com o interesse público e de que só os cidadãos conscientes podem exigir a transparência e a democracia. Os moradores e os tirsenses têm o direito de ser informados e inquiridos de o que está ser despejado às toneladas naquele espaço público e para que fim. Transparentemente.

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