quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Revolução democrática

A expressão é um pleonasmo, uma revolução que não pretenda libertar o povo, transferir para o povo o poder político, não passa de um golpe de Estado.
Quando, no tempo de Marcelo Caetano, a classe média e os estudantes atingiram um peso suficiente na sociedade, esta foi ficando madura para a revolução democrática, que aconteceu, em 25 de Abril de 1974. As pessoas viam os países europeus, aqui ao lado, para onde emigravam, e sentiam que pertencíamos à mesma civilização, a qual já não suportava tiranos há muito.
O mesmo se passa, neste momento, nos países que pertenceram ao Império Romano, à volta do “mare nostrum”, apesar da velha luta dos cristãos contra os mouros, que já enjoa. As pessoas sentem que são parvas por aturarem ditaduras anacrónicas, sentem que pertencemos todos à mesma civilização. E não há tirania que resista ao fim do seu tempo histórico. J
Entre nós a revolução democrática poder-se-à passar com menos dificuldade, por estarmos em “democracia”? Ou a forma sofisticada de a nossa oligarquia se fazer passar por democracia exigirá um grau sofisticado de consciência popular que ainda vamos demorar a atingir? A ausência de censura, a principal “conquista de Abril”, permite, por exemplo, que um vereador da Câmara de Lisboa exponha, publicamente, as complexas teias que protegem a corrupção. Quanto tempo falta, até restaurarmos Abril? Precisaremos de chegar a ter fome para deixarmos de ser parvos? Ou será já este Abril?
Só quando o governo representar, de facto, a vontade popular, poderemos lidar, com eficácia, com a nossa absurda dívida nacional. Não é tarefa ao alcance da oligarquia que temos.
Deolinda no Coliseu a 22 de Janeiro:

Sou da geração sem remuneração
e não me incomoda esta condição.
Que parva que eu sou!
Porque isto está mal e vai continuar,
já é uma sorte eu poder estagiar.
Que parva que eu sou!
E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar.

Sou da geração ‘casinha dos pais’,
se já tenho tudo, pra quê querer mais?
Que parva que eu sou
Filhos, maridos, estou sempre a adiar
e ainda me falta o carro pagar
Que parva que eu sou!
E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar.

Sou da geração ‘vou queixar-me pra quê?’
Há alguém bem pior do que eu na TV.
Que parva que eu sou!
Sou da geração ‘eu já não posso mais!’
que esta situação dura há tempo demais
E parva não sou!
E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar

3 comentários:

  1. Respondo à sua pergunta: sim, vai ser preciso chegar à fome para compreender que é preciso mudar o regime político. Ainda não há gente suficiente que tenha compreendido isso... ou têm medo, medo do comunismo e medo do fascismo, ou medo dos fundamentalismos ou de outros fantasmas. A democracia, porém, está ao alcance da mão, nem haverá violência, quando o povo chegar à rua.
    Para já...Parabéns ao povo egípcio!

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  2. Não, não vai ser em Abril. Nem em Novembro, nem em nenhum outro mês. Para ser sincero, penso que vai ser nunca. O que aconteceu em Abril, estava relacionado com o mal-estar de militares. O desconforto e as injustiças dos militares. Isso acabou. Não há militares milicianos. Há militares profissionais. Poderá haver desconforto mas é outra coisa. este povo, o povo português, vai aguentando e reclamando. Reclamando e aguentando. E assim vai vivendo com ópios. Já foram os 3 f's: futebol, fado e fátima. E agora? Não são os mesmos? Se calhar são. Já canta o poeta: É bonita a festa, pá.

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  3. Obrigado por comentar, Francisco.
    Sou mais optimista que os meus comentadores, porém. Pelo menos espero que as leis europeias tragam a nossa corrupção de níveis africanos para níveis europeus... Sei que vai ser obra! O povo português terá um limiar de revolta mais alto que outros povos, aceito, mas, se continuarem a insistir chegam lá... um destes Abris!
    Abraço

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