Ter carta branca significa não ter satisfações a dar, decidir sem peias, sem a necessidade de discutir os assuntos, de prestar contas, sequer de informar. E dar carta branca a alguém significa abdicar da responsabilidade própria, alienar-se.
Assim fizemos com Salazar e, depois de lhe darmos carta branca para tomar conta deste barco, dificilmente lha soubemos tirar, quando o quisemos.
Mas, em 25 de Abril de 1974, graças às Forças Armadas, assumimos a responsabilidade pelo destino da Pátria, recusámos a alienação.
A democracia não passa de uma ideia, é claro que é pouco prático que as decisões sejam tomadas por todos, em discussão pública. E é ideia mais antiga que a democracia ateniense, uma das primeiras, há dois mil e quinhentos anos. Na ágora todos discutiam os assuntos que eram de todos e, no fim, sorteava-se um dos presentes para realizar as decisões da assembleia. O pobre sabia que iria ter imenso trabalho e que tudo o que fizesse iria ser escrutinado. A sorte que lhe caíra em cima era vista como o fardo que era.
Breve a coisa mudou, Péricles não tinha "carta branca" mas tomava as decisões, dando-se ao trabalho de as aprovar na Assembleia, graças à sua eloquência. E só 10% dos Atenienses tinha direito de voto.
As ideias, porém, movem montanhas, como soi dizer-se. Ainda hoje, vivendo numa democracia de nome, em que damos carta branca a um primeiro-ministro para formar governo ou a um autarca num município para decidir por nós, desejamos viver em democracia, desejamos não ser alienados, desejamos ser responsáveis pelo que acontece em Portugal. Desejamos o que não temos.
A eloquência que permite obter a tal "carta branca" dá vontade de chorar, de fugir, dá arrepios.
Suspeito que as celebrações do aniversário do dia 25 de Abril de 1974, dia em que fomos, de facto, efemeramente, livres e responsáveis, sejam, este ano, tão deprimentes como a coreografia do início do jogo de futebol de ontem, em que o Gil Vicente teve esperança de ganhar a taça da liga. Aterradoras!
As ideias, porém, não se podem matar, nem com tiros nem com mau gosto. E são as ideias que criam a realidade. Discutamos a realidade que queremos! Na família, na freguesia, no município, no país, na Europa, no mundo! Não nos calemos! Da discussão nasce a luz.
10 de Julho de 2012:
afinal, no 10 de Junho, aconteceu um discurso que vale a pena ouvir, do reitor da U. de Lisboa, António Sampaio da Nóvoa.
Palha, meu amigo! O que interessa discutir é como se faz a tal "democracia real".
ResponderEliminarPois faz-se discutindo como se há de fazer!
ResponderEliminarHá outro caminho: tomar por D. Sebastião o primeiro que aparecer e dar-lhe carta branca. Que tal o professor Cavaco? Tem perfil!