sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Lisboa revisitada

Sentei-me na soleira da porta do torreão poente. Escrevo no telefone, embora tenha comprado um caderno na velha papelaria Vidal, onde desemboca a Rua dos Douradores, por 55 cêntimos. Não imagino o Bernardo Soares a comprar papel, aproveitava o que sobrava dos embrulhos, e assim.
Se, agora, aparecer um desses papéis, marcado L. D. , dá para pagar um quarto e para comer durante uns meses largos.

Os turistas, essa gente determinada a ver o que os guias recomendam, quais alunos a quem um exame espera, têm um ar prazenteiro. De alguma forma sentem-se em casa, em Lisboa. Flanam com tempo, há muitos sem máquina fotográfica.
Jovens com ar desportivo ou velhos que arrastam os pés, todos cumprem uma tarefa, porém.

Agora instalei-me no anfiteatro ao ar livre da Gulbenkian para escrever um pouco, ditando para o telefone.
Quando passamos dos 90 anos ficamos num tempo e num espaço intermédio. Falava eu de liberdade e ouvi isto: "liberdade, liberdade, fica cada um para seu canto e não tem graça nenhuma!"
Quem sabe se a nossa obsessão com a liberdade nos não trouxe a solidão?
Somos livres, sim, livres de escrever para leitores imaginários textos egoístas que nada lhes dizem. As crianças continuam a brincar, é provável que a vida continue...E é certo que nós passamos.

A vida consiste em breves momentos; São raros e breves e deixam uma memória pouco clara mas todos temos breves momentos em que nos sentimos vivos. Momentos. O resto do tempo entretemo-nos a fazer o que nos manda o senso comum, às vezes com grande convicção!
Vivos, vivos, só o estamos em breves momentos, espaçados de anos.

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