sábado, 25 de abril de 2015

Os três DDD

Faz hoje 41 anos que um grupo de corajosos militares, com a intuição do apoio que tinham nas Forças Armadas e no conjunto dos portugueses, derrubou o herdeiro do tirano que tantos anos controlara Portugal.
Disseram ao que vinham: criar as condições políticas para haver Democracia, Descolonização e Desenvolvimento, os três DD, creio que por essa ordem.

1. Democracia
A consciência de que o sistema de governos representativos, que tão bem serviu a Europa no pós-guerra, não é Democracia tem aumentado sempre. Cresce o número de portugueses que sabe que nada teve a ver com a escolha do primeiro-ministro, que suspeita que há uma oligarquia que os escolhe e no-los propõe para neles votarmos, que já compreendeu que a alternância é mais do mesmo, que António Costa continuará a pagar os juros agiotas que os seus antecessores aceitaram em nosso nome.

2. Descolonização
A consciência de que as ex-colónias continuam colonizadas, agora por outros, por oligarquias nacionais a cair no domínio dos investidores que as compraram, sejam chineses, sul-africanos ou capital sem rosto, aumenta, lá e cá.

3. Desenvolvimento
A consciência de que o investimento que usámos para criar o nosso desenvolvimento o está a sufocar, com juros agiotas, cresce entre os portugueses, é a inegável realidade, perto de dez milhares de milhões por ano, no nosso orçamento, destinam-se a pagar juros; não temos moeda própria.

Acontece. Temos um problema político, temos a necessidade de uma revolução, de novo. 
Se aproveitarmos a nossa experiência e soubermos lançar as sementes no mundo -- pois estamos noutro tempo, num tempo global -- poderemos dar uma contribuição histórica como a que demos no início do século XVI. E é a Hora!

25 de Abril de 1974. A rua é de todos, se se querem deitar com a sua espingarda, podem, claro! Se fossem polícias da PIDE não se deitavam no chão, estes são pacíficos, de certeza!

domingo, 19 de abril de 2015

A verdade e o poder



Quando assim falou, dizendo que os portugueses podiam estar descansados porque as reservas do Banco Espírito Santo eram suficientes para aguentar o pior cenário, Cavaco Silva baseava-se em informação do Banco de Portugal mas tinha tido contactos com Ricardo Salgado. Podemos pensar que quisesse evitar uma corrida ao Banco, que seria desastrosa, podemos pensar que o Sr. Professor seja crédulo… enganou-se, enganou-nos, como se sabe.
O que já não é aceitável, sob qualquer ponto de vista, é que nos venha dizer, nesta resposta a uma jornalista, que é mentira atribuir-lhe alguma declaração sobre o BES, apenas aceitando ter feito declarações sobre o Banco de Portugal.
O nosso Presidente da República considera-se uma pessoa muito rigorosa, são palavras suas, mas os factos desmentem-no.

O que neste caso me interessa é a veemência com que diz “É mentira!”, referindo-se a algo que é verdade. Quando a realidade não é do nosso gosto, é normal a tendência para a negar; somos capazes de fazer, instantaneamente, uma racionalização que nos descanse, sobretudo quando o assunto se tinge de emoção. Somos assim, as emoções, sem -- ou mesmo com! -- a nossa atenção critica e consciente, tendem a comandar os nossos actos.
Depois do desastre se vê se a estrutura mental do infeliz actor sofreu a influencia da antiga Grécia, se valoriza a verdade ou se prefere valorizar a vaidade, se o erro o aflige ou não.

Quando os factos põem em causa estruturas mentais sem as quais não sabemos que fazer, quando os factos põem em causa o poder, que temos ou pensamos ter, quando são demasiado “incómodos”, quando pedem que abandonemos um paradigma, os temperamentos mais conservadores tendem a negar os factos, a negação é um processo banal de adaptação psicológica. Banal mas desastroso para quem queira ser consciente.
Estamos em tempos de mudança, há negações à escala planetária. A negação das crescentes temperaturas, do risco de ficarmos num planeta inabitável é das mais chocantes, sobretudo porque sabemos que tem origem na ganância do lucro das companhias de petróleo.
Mas há outras e, se o leitor entender bem o inglês, decerto vai apreciar este documentário, The Day Before Disclosure

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Uma notícia que vem da Islândia

Há dezenas de anos que é assim: os bancos podem emprestar o dinheiro dos seus depositantes e ficar apenas com 10%. E podem ir buscar ao banco central 100, ficar com 100 nos activos e emprestar 90.
Ou seja, criam moeda. Se emprestarem os 90 a outro banco este pode emprestar 81 e por aí fora…
É claro que, na origem destas leis que regulamentam o sistema bancário, estão -- os banqueiros. Donos dos bancos centrais, que são “independentes” dos Estados, e donos dos nossos governos, “livremente” eleitos mas por eles escolhidos para o serem.

Com o tempo toda a sociedade foi ficando endividada e mesmo quem resiste está a pagar impostos que se destinam a pagar os juros da dívida “soberana”.
Há uma “narrativa” que nos vende este sistema como o único possível e a pobreza de todos como o resultado do “livre” endividamento de pessoas e Estados. Diz-nos que pagar os juros é o que fazem as pessoas honestas e não quer saber de como isto aconteceu. Nem de onde nos leva este caminho de endividamento “infinito”, agora para pagar juros.

Mas houve um povo que resistiu; que apresentou à Justiça os governantes e banqueiros que levaram o país à bancarrota. E que, esta semana, teve a coragem de pôr o sistema em causa: daqui para a frente os bancos só emprestam o dinheiro que têm, são forçados a ter reservas no banco central: deixam de produzir moeda, deixam de ser como todos os bancos do mundo. A coroa islandesa não sofreu com a medida, pelo contrário, e esta experiência de um povo que tem menos de 400 000 habitantes é uma grande contribuição para resolver um dos magnos problemas do nosso tempo: o de vivemos num sistema que nos empobrece, aceleradamente.

No último “post” republiquei a entrevista catalã a Eduardo Galeano, de 2013, a propósito dos “indignados” da Praça do Sol, em Madrid. Diz ele que o mundo se divide em indignados e indignos. Fiquei a pensar se a preguiça de pensar, que permite a tanta gente fugir ao desagradável que é sentir-se indignado, será uma “indignidade”. Fiquei a pensar se se pode falar assim, dar ao Homem a responsabilidade de ser consciente, de resistir, como os islandeses, à narrativa oficial.
É inegável que esse povo nos deu um exemplo de coragem e dignidade.

Última hora: O primeiro-ministro descobriu que, sem “outras políticas estruturais”, não baixamos o desemprego para menos de 10%. Tudo indica que irá dar o exemplo da Islândia na reunião intergovernamental da União Europeia.
Acrescento ao “post” (19 de Abril): Há indícios de que a “descoberta” do nosso eleito (de que não poderemos sair disto sem “outras políticas estruturais”) se deve a ter sido tratado pelo médico hipnotizador nova-yorquino Michael Ellder, aquele que escreveu:
"Olhem para nós. Está tudo ao contrário. Tudo de cabeça para baixo. Os médicos destroem a saúde. Os juristas destroem a justiça. As universidades destroem o conhecimento. Os governos destroem a liberdade. Os grandes meios de comunicação destroem a informação e a religião destrói a espiritualidade.” 
Mas parece que o efeito do tratamento é temporário e em breve veremos o nosso eleito gabando-se publicamente de ter descido o desemprego para 15%.

terça-feira, 7 de abril de 2015

Uma ode de Ricardo Reis

Melhor destino que o de conhecer-se
Não frui quem mente frui. Antes, sabendo,
Ser nada, que ignorando:
Nada dentro de nada.
Se não houver em mim poder que vença
As Parcas três e as moles do futuro,
Já me dêem os deuses o poder de sabê-lo;
E a beleza, incriável por meu sestro,
Eu goze externa e dada, repetida
Em meus passivos olhos,
Lagos que a morte seca.

As Parcas Reunidas entre as Estrelas, de Elihu Vedder (1887)
As Parcas ou Moiras teciam o destino de quem ia nascer
Nota: Sestro é hábito, teima, vício

domingo, 5 de abril de 2015

Aleluia


A Primavera é a Ressurreição da Natureza, o triunfo da Vida; a esperança de frutos, com o nascer das folhas que os hão-de alimentar, das flores que, amando-se, os hão de gerar.
Tudo pode ser símbolo, assim a Páscoa.
Para ressuscitar é preciso morrer. Para que a casa esteja limpa para a festa é preciso abandonar o que já não serve, o lixo que se acumulou pelos cantos.
Na nossa cultura era costume tomar banho, pela Páscoa, e lavar a alminha, com a confissão anual.
Procurar, no inconsciente, o lixo que se acumulou; descortinar (descobrir, correr as cortinas) aquilo que, desnecessário, atrapalha a vida. Velhas culpas, velhos rancores, memórias recalcadas -- e fazer disso o estrume que a alimenta, decompondo-se, química ou alquímicamente.

Assim como o lixo nos sapatos atrapalha o caminhar, pede que paremos e nos descalcemos, assim as culpas, nossas e dos outros, pedem que paremos, falemos com elas o falar da vida, da esperança dos frutos, e as deixemos para trás, não guardando delas mais que a sabedoria que nos deram, a Paz que vem quando se entende com o coração. 

Criticar a cultura em que nascemos pode ser uma forma de amor. Uma forma de a ajudar a “ressuscitar”. Cito aqui Frei Bento Domingues, hoje no “Público”: "Não sendo especialista das alterações da geografia do catolicismo português nas últimas décadas, é de supor que só nas cidades e nas suas periferias — em permanente mudança e reconfiguração — poderá ressuscitar. Os modelos rurais do passado serão impraticáveis”.

Sou dos que não “sabem” se o pregador da Galileia de há dois mil anos ressuscitou na carne. Mas sei que a essência da sabedoria que deixou -- “amai o próximo como a vós mesmos” -- merece ser “ressuscitada”: Só se nos amarmos a nós mesmos saberemos amar. Se o Catolicismo “ressuscitar”, nas cidades ou no campo, ele ensinará as crianças a amarem-se a si mesmas, ter-se-à libertado da compulsão para as adulterar, amedrontar, infernizar com a culpa do pecado original -- lembrar-se-à que Cristo o lavou no Baptismo. Curiosamente, o artigo citado intitula-se “Páscoa de muitas Páscoas” e estamos em tempos de mudança, esta Primavera pede uma limpeza ainda mais radical que nos outros anos! Há muito passado para deixar para trás.
Aleluia!