Somos um povo sentimental, a miséria humedece-nos os olhos e, no nevoeiro que os sentimentos nos trazem, não vemos como remediar as coisas.
Cada um tem a sua hierarquia de valores e assim me parece bem. Parece-me bem porque, na minha, a Liberdade está muito perto do topo, que talvez seja a estética. Os meus olhos humedecem quando vejo a beleza... e quando vejo a sua destruição.
O sistema monetário e financeiro mundial é inestético: como todas as coisas que funcionam mal. Manfred Max-Neef, antigo professor de economia de Berkley fez as contas e, nesta conferencia, diz-nos durante quanto tempo resolveríamos o problema da fome no mundo com o bail out que os bancos americanos pediram, em 2008, ao governo americano para endireitar as suas finanças -- e conseguiram!--, depois de a sua ganância os ter levado a correr riscos insensatos e sem controle: 600 anos! Seiscentos anos sem fome no mundo!
É sabido que, para salvar o lucro fictício dos bancos se criou moeda e se exportou o problema. Aqui na Europa, para "resolver" o assunto dos créditos mal parados dos bancos sem estes assumirem as suas perdas criou-se uma engrenagem em que eles vão buscar a 1% ao Banco central europeu e emprestam aos países a mais de 6% -- muito mais, de facto.
Porque é que os povos aceitam tal coisa? Porque se habituaram a fazer dívida e já não sabem viver sem pedir emprestado -- não pensaram que os juros pudessem subir exponencialmente.
Mas os responsáveis são os povos ou serão os seus políticos, ligados aos bancos? Este vídeo tem mais de um ano, o marketing explicou-nos que os políticos nunca são os responsáveis, e nós, aparentemente, acreditámos:
Os povos cansar-se-ão de ser responsabilizados pelos negócios de alguns bancos, sejam eles mesmo grandes, internacionais, ou pequeninos, "nossos". Essa brincadeira de eles terem sempre uma rede para os seus negócios arriscados, para os seus malabarismos de fazer dinheiro a partir do nada, rede que é feita de gente, gente que confiou naqueles que elegeu, deixou de ter graça.
Acho bonito confiar. Mas acho inestético confiar em quem nos mentiu vezes demais. A burrice nada tem de estético. O sistema pede-nos que confiemos em tolices crescentemente mais absurdas. Então empobrecer toda a gente, levar as PMEs à falência, baixar necessariamente o rendimento colectável e a remota hipótese de pagar a dívida é o caminho para vivermos melhor?
Tirando o sistema monetário e financeiro, coisa antiquada e prejudicial à humanidade, o progresso científico e técnico é uma realidade. O método científico, de que os portugueses de quinhentos foram percursores, é bonito porque funciona bem. A razão é instrumento que merece continuar a ser usado. Para resolver problemas é claramente preferível a uma cena de lágrimas.
Hipótese e experiência: se a hipótese for a de que a austeridade resolve as dívidas dos países em que for aplicada, experimenta-se e analisam-se os resultados. São bem claros, a hipótese deve ser abandonada, a Grécia é uma experiência que não precisaria de ter sido feita, depois de tantas outras!
Se a hipótese for a de que a globalização e a desregulamentação do capital financeiro internacional trará enriquecimento dos povos, experimenta-se. A experiência foi feita e já sabemos, há anos, que trouxe empobrecimento, fome e enriquecimento de uma ínfima minoria da humanidade.
É bonito confiar no que nos dizem mas confiar no marketing quando ele nega a evidência não é bonito: é inconsciência, é pura estupidez -- é coisa inestética;-)
Confio na razão, na ciência, confio nas pessoas, na criatividade humana, potenciada pela liberdade e pela troca de ideias -- não confio no marketing!
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